Recordando

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Viagem ao Umbigo do Mundo


     São Pedro de Atacama - a vida
==============================================================

(Excerto do livro "Viagem ao Umbigo do Mundo", publicado em 2006)

Nossa turma dirigiu-se a hotel já conhecido de outras viagens, algo com uma aparência bem estranha por fora, com seu muro e suas paredes de adobe não rebocado, mas logo me dei conta do luxo sofisticado que havia no interior das construções, onde se pagava mais de cem dólares para se dormir uma noite, onde havia uma cozinha internacional e pequenas cabanas de adobe em torno de um pátio, com amplos banheiros luxuosos, que tinham um único inconveniente: toda a água era salgada. A gente lavava o cabelo e ele ficava duro como pau, e era como se se tivesse tomado um banho de mar. A cobertura era de palha, mas poderia não haver – faz perto de 500 anos que não chove por ali. Uma característica das coberturas das casas nessa região do deserto é que, acima da palha, penso que para barrar as ondas de calor que o sol provoca durante o dia, há uma camada de barro.
                                   Num instante eu tomara meu banho salgado, comera um prato de comida internacional (daquelas que vem só um pouquinho por pessoa, e que me deixa com fome) e saíra para descobrir São Pedro de Atacama.
                                   Meu, era um encanto andar por ali, naquele mundo um pouco indefinido entre o colonial espanhol e o do antigo povo de Atacama, ver aquele museu fantástico, observar os muitos turistas de línguas estranhas a conversarem na praça e nas ruas – eu acho que só tem um jeito de explicar São Pedro do Atacama: é indo lá e vendo pessoalmente. O povo local é gentil e simpático, e quando fui a um café cibernético, descobri que o rapaz que lá trabalhava era um escritor de contos. Ficamos de nos comunicar depois mas, infelizmente, acabei perdendo o endereço dele antes de chegar em casa. Foi uma pena, pois queria muito saber o que pensa um jovem atacamenho em pleno século XXI. De qualquer forma, ele me ajudou um bocado, fez um novo endereço eletrônico para eu ir armazenando até chegar em casa  as principais coisas que estava recebendo e que não podia perder, inclusive os diários daquela viagem, que estava mandando para muitos lugares.          
                                   Aquele dia se finou dentro do encantamento de São Pedro de Atacama, e olhando para trás agora, vejo-me a farejar as ruas, os cantos, a praça, bem como se fosse um cachorro vadio que fizesse aquilo com muita alegria, abanando o rabo. Depois dormi aconchegada e quietinha na minha luxuosa cabana de adobe e palha, feliz porque na manhã seguinte não teria que levantar cedo. Haveria um passeio opcional na madrugada, e quando soube que para ir era necessário levantar às três da manhã, achei que era melhor ver as fotos, depois. Uma parte do nosso pessoal foi ao passeio, ver o El Tatio, um lugar ali nas redondezas onde se tinha que chegar às seis da manhã, para se ver geisers que afloravam jatos de água fervente à superfície rochosa de um plano e formavam um quadro curioso e encantador, tanto pelas fotografias que vi quanto pelo entusiasmo com que contaram a respeito os que lá estiveram. Entre outras coisas, os guias de turismo faziam e serviam um café da manhã, preparando-o nas águas ferventes dos geisers, isto é, fervendo caixas de leite e cozinhando ovos, entre outras coisas, para servir aos turistas. Naquele  lugar estava-se a grande altitude e era muito frio, mas havia tantos geisers e tanta água fervente saindo para o mundo gelado, que as águas acabavam formando piscinas naturais de boa temperatura, e quem quis, pode tirar a roupa e tomar banho naquela prodigiosa delícia da natureza.
                                                                  Como não fui a El Tatio, dormi quanto quis, e ainda aproveitei para mais uma sessão de passeios e de Internet. Fui almoçar a boa comida que nem sei se é típica, e que existe nos pequenos restaurantes de adobe de São Pedro de Atacama. Há tanta gente lá, de tantas partes do mundo, que é possível que hoje haja comidas de todos os continentes vicejando naqueles pequenos restaurantes. Quisera ter comido alguma coisa tipicamente atacamenha, mas não sei se o fiz.
                                                                                        
                                                                                                    Urda Alice Klueger 
 urda@flynet.com.br
      Escritora, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR

Nenhum comentário:

Postar um comentário