“Da
minha cadeira de balanço, onde estou descansando, vejo a chuva que
torrencialmente cai. Num intervalo de uma tragada no meu grosso cigarro de palha,
eu delicio de uma vida despreocupada, quase juvenil. Um frio pouco intenso, eu,
à beira de uma fornalha, descanso dos anos anteriores. Enfim, hoje, calmo aqui sentado,
vejo a vida diferente. Ela me ensinou a ser bom quando alguém merecia, e também
a castigar. Na juventude, bobo como todos nesta fase, tive ilusões com o sexo oposto.
Não tive mais por me despertar em tempo. Esfrego as mãos para defendê-las do frio, sinto
que nada tenho nos dedos, a não ser o anel de formatura. Tenho minha cabeça
como algodão. Estes cabelos custaram a vir, só de poucos anos para cá
apareceram. Levanto, vou à janela, passo a mão na vidraça e vejo relâmpagos
misturados com a chuva. Lá o pasto, as montanhas bem ao longe, onde longos anos
vivi caçando. Agora só tenho o prazer de olhar. As pernas eram fortes, disposição
não faltava. Tudo parece impossível. Aqui ao lado da casa, uma enorme árvore
sabe muito de minha vida. Muitas vezes passei tardes recostado ao seu tronco, com
o violão em punho, fazendo canções. Volto à minha cadeira com novo cigarro. Mal
posso andar. Sinto a minha hora chegar. Devíamos viver até certo tempo, para
não sentirmos tanto o peso dos anos! Mas tenho que ser forte e não covarde. Muitos
passaram por isso. Não sei quando chegará a minha vez. Pode ser hoje ou daqui a
anos, ou nem dure meses, ou nem, termine de fumar. Que morte agradável seria! Ele
preso em meus dedos, a ultima tragada no ar em fumaça e minha vida seguindo sua
trajetória.”
(Do livro FRAGMENTOS, de Leví Lafetá - Edição 1968)
(Do livro FRAGMENTOS, de Leví Lafetá - Edição 1968)
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